quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Condições para uma intervenção militar estão desenhadas


O Supremo decide afastar da linha sucessória da presidência políticos que sejam réus na justiça, uma medida autoritária que reflete bem o espírito do tempo no Brasil. Dias Toffoli, contrário à decisão, resolve interromper a votação quando ela já estava definida, com um pedido de vistas maroto, chicana que aprendeu com seu mestre Gilmar Mendes. Então, depois de altercações públicas sobre accountability do Judiciário entre ministros do STF e o presidente do Senado e de faixas pedindo "fora Renan" nas manifestações do MBL, Marco Aurélio Mello manda afastá-lo do cargo em decisão monocrática. Renan Calheiros se esconde do oficial de justiça para não receber a notificação - ou melhor, não se esconde, desfila na frente dele enquanto manda a secretária dizer que não está. Ao mesmo tempo, a mesa do Senado comunica que não vai obedecer à liminar emanada do Supremo, manobra que conta com a participação ativa de Jorge Viana, petista que seria alçado à presidência da casa com o afastamento de Renan, mas que morre de medo de ter que exercer, na prática, seu oposicionismo verbal ao governo golpista.

Que lições extraímos disso tudo, afora a confirmação da propensão nacional para a chanchada e da máxima segundo a qual, no Brasil, ninguém morre de tédio?
A principal é que, com o golpe que destituiu uma presidente eleita, o arcabouço institucional da Constituição de 1988 foi oficialmente para o saco e entramos na lei da selva. Quem gritar mais alto, ganha. Com um executivo frágil, sem liderança e sem legitimidade, e com um legislativo que não vê além da própria venalidade, o judiciário entendeu que está em condições de impor sua supremacia. Mas Renan, que pode ser muitas coisas, mas para tolo não serve, entendeu que devia gritar também, gerando o impasse em que nos encontramos.
Ao mesmo tempo, a crise econômica, que em certo momento parecia sob medida para alimentar a campanha contra Dilma, saiu do controle e o cenário se projeta sombrio para o futuro. Para completar o quadro, o governo Temer anunciou uma reforma da Previdência perfeita para gerar convulsão social, rompendo expectativas até de quem já estava a um passo da aposentadoria e impondo ônus desmedidos sobre a classe trabalhadora.
São circunstâncias que ajudam a construir um discurso de justificação de uma intervenção excepcional e salvadora: instituições falidas, incapacidade da classe política para conduzir o país, risco de caos. Quem viu os cartazes e slogans das manifestações de domingo passado sabe que o fechamento do Congresso e a suspensão das eleições teriam o aplauso de uma fatia grande da classe média. Como sempre, quando a situação é de ganha quem pode mais, aqueles que controlam as armas estão em situação de vantagem. Pela primeira vez desde que o golpe começou, as condições para uma intervenção militar estão sendo desenhadas. Resta saber qual é a disposição predominante no generalato.
Em 1964 ocorreu algo similar. O golpe foi militar, mas muitas das vivandeiras dos quartéis queriam apenas brincar de destituir presidente, esmagar uma corrente política e depois voltar à "normalidade" da competição eleitoral.

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